segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

O QUADRO ATUAL DA JUVENTUDE BRASILEIRA: aspectos históricos, culturais e sociológicos


Narcélio Ferreira de Lima
Religioso do Instituto Nova Jerusalém e aluno da Faculdade Católica de Fortaleza



INTRODUÇÃO


            Hoje em dia se tornou muito comum não somente na sociedade brasileira, dar ênfase, especialmente nas áreas de sociologia, psicologia, pedagogia e antropologia o tema da juventude, uma parte da sociedade que contribui para o seu desenvolvimento, mas que também é alvo de preocupações nos termos de educação, trabalho e violência. Já se falou de temas relacionados à formação da personalidade e desenvolvimento psíquico dos  jovens dentro de uma perspectiva pessoal e social. Há também uma tentativa de bem definir o desenvolvimento biológico e a exata faixa etária dessa fase tanto pela biologia, quanto pela psicologia e sociologia, ou seja, a respeito da maturação e transição entre idade infantil e idade adulta e suas respectivas modificações.
            O presente trabalho inicia-se com dados históricos da juventude brasileira, pois, segundo a autora Fernanda Quixabeira Machado, da Universidade Federal de Goiás, em um artigo publicado em junho de 2004, pouco se tem trabalhado esse aspecto histórico, que poderá apontar caminhos para futuras investigações. Segundo os autores especializados no tema: Giovanni Levi e Jean-Claude Schmitt, a história da juventude se configura como um terreno privilegiado de experimentação historiográfica (1996, p. 10). A partir desse dado é que iniciaremos dando “pinceladas” e algumas voltas na história do Brasil para então partirmos para os fatores culturais e sociológicos que a juventude brasileira enfrentou e enfrenta até hoje.
            Certo de que, para uma compreensão mais clara e cristalizada a respeito do tema, é de fundamental importância partir de sua história, pois a juventude não é apenas uma “faixa etária” em preparação à fase adulta, ela é também uma construção social e cultural. Em nenhum ponto e lugar da história ela deve ser definida apenas por critérios exclusivamente biológicos ou jurídicos; sempre e em todos os lugares ela é investida de muitos outros riquíssimos valores, mesmo com sua realidade aquém do que esperamos.
            O presente trabalho tem como principal objetivo a reflexão sobre o quadro atual em que se passa nossa juventude, que por sua vez representa a “classe pensante”, por isso é nosso costume chamá-la de futuro da nação.


ASPECTOS HISTÓRICOS


            Há pouco mais de quinhentos anos atrás, no relato em que a frota de Cabral encontrou terra, o escrivão Pero Vaz de Caminha relatou que a “Terra Brasilis” era habitada por um povo amável e sorridente, pacato, dotado de recursos naturais capazes de transformar-se em uma nação rica e próspera. Podemos dizer hoje que boa parte da expectativa de Caminha se concretizou: a independência de Portugal foi proclamada, preservou-se seu território (muito maior do que o descrito no relato da carta do escrivão), firmamo-nos em uma nação respeitável no nosso planeta. O Brasil é conhecido internacionalmente pelo caráter amistoso de seu povo... Por outro lado, deixou muito a desejar. Boa parte da população ficou desprovida de posses, ou seja, à margem do progresso e da inclusão social.
            Na medida em que o Brasil ia se modernizando, a população rural foi trocando o campo pelas grandes cidades. Na metade do século passado, o Brasil implantou uma indústria moderna, começou a desenvolver uma agricultura dinâmica e tornou-se mundialmente conhecido em algumas áreas do conhecimento.
            Como nem tudo é flores, o país também vivenciou muitas crises. Após a segunda guerra mundial, precisamente no final dos anos 70 e após o país ter vivenciado mais de vinte anos de regime militar, o dinamismo perdeu o fôlego, sobretudo devido o plano de desenvolvimento governamental do presidente Garrastazu Médici. Restaram dívida externa, país isolado do fluxo de capital internacional, inflação ao ponto de estourar uma hiperinflação aberta, crise fiscal, aumento de impostos, paralisação do crescimento econômico, trava do investimento, da geração de empregos, aumento da pobreza, causando caos nos centros urbanos, aumentando assim a delinqüência e criminalidade... Daí surge uma pergunta: “Quem mais sofre com tudo isso?”, a resposta é: os pobres, especialmente os jovens. Isso gerou uma ilusão de futuro no povo brasileiro. O Brasil então deixou de ser um país de imigrantes para se tornar emigrante. A Emigração no Brasil ocorreu em grande escala como uma salvação na segunda metade da década de 80 onde o perfil do emigrante eram de homens jovens e solteiros que mudavam-se temporariamente. Desde então este fluxo vem diminuindo, mas nunca cessou. Os emigrantes atuais são jovens de classe média baixa, classe média média e até classe média alta que possuem famílias com filhos, no caso dos que migram para os EUA pensam que a América é uma alternativa, já que no Brasil existe a dificuldade de mobilidade social, além da desvalorização do real ser um estímulo também para o êxodo. Hoje existem em média 1,5 – 1,8 milhões de brasileiros no exterior, o equivalente a 1% da sua população total. Cerca de 70% desse número está nos Estados Unidos. Os países mais procurados, além dos EUA são Japão e Paraguai.
            Mas nem tudo é espinho, nem tudo deve ser olhado de um ângulo pessimista! De todas essas crises, apareceram sinais de vida e esperança para o nosso povo: a queda da mortalidade infantil e o aumento da freqüência escolar. E o mais importante: o Brasil conseguiu estabilizar os preços e comprometer as autoridades públicas ao criar a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), mostrando assim sinais de maturidade. O Plano Real, criado em 1994 pelo presidente Itamar Franco, que tinha como objetivo a estabilização econômica, deu possibilidade de uma volta temporária ao crescimento, mesmo sabendo que o país havia se tornado vulnerável a crises externas e alvo de crescente desconfiança dos investidores. Em 1998 o Brasil passou pelo racionamento de energia, crescimento da dívida externa.
            Mas, como “Deus é brasileiro” e para surpresa de muitos, as principais diretrizes da política econômica foram mantidas e os contratos respeitados pelo novo governo Luiz Inácio Lula da Silva, que assumiu a presidência do país no primeiro dia de janeiro de 2003. Em 2004 houve queda da inflação, recuperação significativa da atividade econômica e emprego. Após uma difícil recuperação, o Brasil entra em 2005 apresentando indicadores de crescimento em sua economia.
            Fatores como estes podem nos mostrar como e onde está a nossa juventude. Ela não caiu do céu de paraquedas, mas é fruto de constantes lutas e conquistas, vem de um longo processo histórico.


ASPECTOS CULTURAIS


            “Ninguém segura a juventude do Brasil!”. Para se estudar esse objeto é necessário sondar os fatores históricos e culturais utilizados pela juventude e que também são objetos de estudo; são eles: CINEMA, MÚSICA, PROPAGANDA, PINTURA, CHARGE, FOTO, POESIA e TEATRO, fontes valiosas que podem revelar o que esse grupo pensa, como se expressa e o que o leva a se manifestar por meio de tais eventos. A pessoa que estuda esse tema deve usar toda a sua criatividade para se chegar a uma conclusão mais sólida, pois como falamos anteriormente, a juventude jamais poderá ser classificada apenas como uma fase da vida humana, ela é expressão constituída de riquíssimos valos sociais e históricos.
            A nossa sociedade brasileira passou por grandes transformações no século passado envolvendo todos os grupos que a compõe: a política, a religião, a sociedade e a família. As crises político-econômicas também contribuíram para essas mudanças. Com essas metamorfoses surgiram também vários “novos problemas” na história não somente do Brasil, mas no mudo todo. Em 1974, na França, é lançado um livro onde são abordados esses novos problemas.  No terceiro volume é citado o novo objeto da história: os JOVENS. (Cf. LE GOFF, Jacques e NORA, Pierre).
            Estudos sobre a história da juventude no Brasil destacam e até privilegiam as manifestações estudantis que iniciaram pela década de 1950. Depois disso, a juventude brasileira recebeu várias denominações. Na década de 50, intitulada “anos dourados”, a juventude ficou conhecida como rebeldes sem causa ou juventude transviada. Na década dos “anos rebeldes”, 1960, ela passa a ser chamada de revolucionária. Por fim, chega à década de 1990 onde se fala de uma geração Shopping Center. Essas nomenclaturas, na verdade são cheias de preconceitos devido o contexto histórico da época.
            Hobsbawm (1995) comenta que, a partir dos anos 1950 a juventude brasileira vivenciou uma espécie de ascensão, seguindo o modelo dos Estados Unidos, onde a juventude, em especial de classe média e alta se tornava dominante nas economias do mercado desenvolvido. Talvez estejamos no ponto de partida de tais transformações radicais e aceleradas. Houve na verdade uma revolução no modo de pensar e fazer a história. Essa revolução foi quebrando os paradigmas tradicionais e foram-se criando características próprias, pois antes, os jovens seguiam uma linha talvez “robótica”, mesmo estando a par de tudo o que acontecia na sociedade. Então o jovem foi ocupando o seu devido lugar na história: o de ser protagonista da mesma. Grupos até então excluídos como os prisioneiros, imigrantes, soldados, homossexuais, mulheres, crianças, escravos e os próprios jovens passaram a ser vistos com novo olhar, um olhar reflexivo, e mesmo com desconfiança.


ASPECTOS SOCIOLÓGICOS


Uma palavra que caracteriza bem o quadro do século XX é metamorfose. Hoje o Brasil vive um processo de transição histórico. Antes, ele nunca pôde presenciar, na sua história, um número tão expressivo de jovens. Segundo dados da Secretaria de Planejamento, em 2003 o país possuía 33,85 milhões de jovens com faixa etária de 15 a 24 anos, o equivalente a 19,5% de sua população total. Hoje, segundo o IBGE, são 24,1%. O número é bem expressivo, mas é importante ressaltar que nós ainda não possuímos a capacidade de satisfazer as aspirações dos mesmos.  Essa situação é alcançada em condições nada favoráveis. Deficiências nas áreas de EDUCAÇÃO, TRABALHO, CONDIÇÕES DE VIDA e a grande questão da VIOLÊNCIA traduzem-se em menos oportunidades, especialmente porque a legislação trabalhista impõe barreiras para isso, aumentando assim o nível de pobreza e a criminalidade, especialmente nos grandes centros urbanos. O grau de desigualdade não diminui e a falta de serviços sociais básicos revelam que os jovens não apenas são o problema, mas geram problemas.
A desigualdade social está intimamente ligada ao ambiente familiar. Não há como interferir nesses pontos cruciais e nem oferecer ao jovem esperanças se a família não conta com recursos básicos. O desenvolvimento não cai do céu, é fruto do trabalho do homem, não é mágica, mas tem de chegar a todos. Enquanto no Brasil muitos se corrompem com estratégias políticas ilícitas, milhares de brasileiros sofrem.
Mesmo com tais melhorias educacionais em nosso país, ainda não estamos oferecendo aos nossos jovens as oportunidades para que se eduquem. Muito tem ajudado o projeto EJA – Educação de Jovens e Adultos, que desde 2003 já atendeu a mais de 12 milhões, porém, o fato é que o índice de analfabetismo é surpreendente e está muito distante do ideal proposto para um país em desenvolvimento como o nosso. O Brasil tem atualmente cerca de 16 milhões de analfabetos e metade deste número está concentrada em menos de 10% dos municípios do país. O gargalo está no ensino superior: apenas 12% dos jovens que concluem o ensino médio conseguem se inserir em faculdades. No Brasil, quem melhor se desenvolve educacionalmente são os filhos das famílias sulistas.
Além do fator educacional, que é fundamental, mas que não é tudo, sabemos que 75% dos jovens possuem renda própria inferior à renda per capita da família.
A taxa anual de mortalidade por causas externas entre a faixa etária de 20 a 29 anos supera 100 óbitos por 100.000 pessoas. A maior parte desse número está relacionado com homicídio e acidente com transporte. Entre 10 a 29 anos, apenas 12% é de mulheres.


CONCLUSÃO


É preciso estudar e repensar a nossa própria história. É preciso olhar para trás, se for o caso, e rever aquilo que acertamos e erramos, só assim sonharemos com os pés no chão. Pensamento positivo não basta, é preciso ter mãos e pés ativos. É preciso saber para onde se caminha, reconhecer, enquanto sociedade, as nossas limitações. Pensar criticamente e, mesmo que pareça utópico, começar de pequenos gestos, dentro de casa, na igreja, na comunidade, na escola...
Que problemas ameaçam a nossa juventude de hoje?
Será que temos condições de oferecer um futuro melhor aos nossos jovens, enquanto sociedade brasileira?
Que futuro estamos construindo para nossos filhos e netos?

São esses questionamentos e outros que nos levam a olhar para nossa própria história e tirar dela, o que temos de melhor. Já que temos um cenário de otimismo dentro desta perspectiva, não custa nada ousar, criar, pensar... Pois Pero Vaz de Caminha não era brasileiro, mas pensou com o coração verde-e-amarelo ao escrever sua carta.
Encerrando com uma frase célebre de Hegel: “Se você chama de criminoso alguém que cometeu um crime, você ignora todos os aspectos de sua personalidade ou de sua vida que não são criminosos!”. É muito fácil olhar para o rosto de um jovem brasileiro e lhe preencher de conceitos, rotular suas expressões, e repreender seu jeito de ser, porém, saibamos que eles são responsáveis pela continuação de nossa história. Se não apostamos em sua força, quem fará isso por nós?



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


 LEVI, Giovanni & SCHMITT, Jean-Claude (orgs). História dos jovens I: da antiguidade à era  moderna. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.


<http://www.proec.ufg.br> Acesso em 30/03/2011.

<http://en.ipea.gov.br> Acesso em 30/03/2011.

<http://www.ibge.gov.br> Acesso em 04/04/2011.


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